Ninguém nasce Pablo Neruda - nem o próprio Pablo Neruda nasceu Pablo Neruda.
Explico: o nome "real" de Neruda é Neftalí Ricardo Reyes Basoalto (o pseudônimo e seu motivo nunca foram bem explicados pelo escritor)
A grandiosidade alcançada pelo poeta chileno no auge de sua produção é resultado, não de um milagre, mas de um processo. Quem lê "Residência na terra" há de entender que antes do meio-dia sempre há uma manhã crepuscular, assim sendo, Pablo Neruda inicia-se na literatura com um livro profético: "Crepusculário".
O livro reúne os poemas escritos por Neruda entre os dezesseis e os dezessete anos, quando, segundo o próprio, escrevia entre dois e cinco poemas diariamente. Já no "Início" (primeiro poema do livro), o precoce gênio avisa:
"Fecho, fecho os lábios, mas em rosas frementes
se desata minha voz, como água na fonte.
Que não são pomposas, que não são fragrantes,
são as primeiras rosas - irmão caminhante -
de meu desconsolado jardim adolescente."
A primeira publicação consta de 1923, quando o iniciante Neruda ainda publicava avulsamente em jornais e revistas, e é dividida em "capítulos".
O primeiro é Helios. Nele, tomam destaque os questionamentos sobre Deus (observado com ênfase em "Pantheos"), sobre o tempo (como em "Velho cego, choravas") e sobre o amor (em "Novo soneto para Helena"), mas em todos vê-se uma forte influência parnasiana e surrealista:
"Se quiseres não nos diga de que ramo somos,
não nos diga quando, nem nos diga como,
mas nos diga para onde nos levará a morte..."
(trecho de Pantheos)
"Porque se tu conheces o caminho que leva
em dois ou três minutos para a vida nova,
velho cego, o que esperas, o que podes esperar?"
(trecho de Viejo ciego, llorabas)
"E será tarde, porque se foi minha adolescência,
tarde porque as flores uma vez só dão essência
e porque ainda que me chames estarei tão longe..."
(trecho de Novo soneto para Helena)
O segundo é Fareweel, y los sollozos. Nele, o amor toma destaque, mas o aspecto parnasiano perde força, dando espaço para uma forte carga surrealista, na temática, e modernista, na estética. Farewell, que parece ser o poema central (e titular) do capítulo, destaca-se como uma carta - interrompida por parênteses literais.
"(Amo o amor dos marinheiros
que beijam e se vão.
Deixam uma promessa.
Não voltam nunca mais.
Não voltam nunca mais.
Em cada porto uma mulher espera:
os marinheiros beijam e se vão.
Uma noite se encostam na morte
no leito do mar.
(4)
Amo o amor que se reparte
em beijos, leito e pão.
Amor que pode ser eterno
e pode ser fugaz.
Amor que quer libertar-se
para voltar a amar.
Amor divinizado que se achega.
Amor divinizado que se vai.)"
(Trecho de Farewell)
"Como saberia amar-te, mulher, como saberia
amar-te, amar-te como ninguém soube jamais!
Morrer e ainda
amar-te mais.
E ainda
amar-te mais
e mais."
(Trecho de Amor)
" Amor - chegado que tenhas
a minha fonte distante,
torce-me as vertentes,
crispa-me as entranhas.
E assim uma tarde - amor de mão crueis -,
ajoelhado, te agradecerei."
(Trecho de Grita)
O terceiro é Los Crepusculos de Maruri. Segundo o próprio Neruda, os poemas desse capítulo foram escritos por ele enquanto admirava os poentes. Eles focam nos devaneios advindos dessa contemplação e são tomados pelo experimentalismo modernista.
"A tarde sobre os telhados
cai
e cai...
Quem lhe disse que viesse
asas de ave?
E este silêncio que enche
tudo,
de que país de astros
veio só?
E por que esta bruma
- pluma trêmula -
beijo de chuva
- sensitiva -
caiu em silêncio - e para sempre -
sobre minha vida?"
(Poema La tarde sobre los tejados)
"Minha alma é um carrossel vazio no crepúsculo..."
(Poema Mi alma)
"Minhas alegrias nunca saberás, maninha,
e esta é a minha dor, não as posso te dar:
vieram como pássaros a pousar em minha vida,
uma palavra dura as faria voar."
(Trecho de Hoy, que es el cumpleaños de mi hermana)
O quarto capítulo é Ventana al camino. Nele, o surrealismo ganha força total e as metáforas - quase herméticas - tomam os poemas.
"Entretanto é tão vasto céu
e roda o tempo, entretanto.
Estender-se e deixar-se levar
por este vento azul e amargo!..."
(Trecho de Playa del Sur)
"Ela - a que me amava - morreu na Primavera.
Recordo ainda seus olhos de pomba em desconsolo.
Ela - a que me amava - fechou os olhos. Tarde.
Tarde de campo, azul. Tardes de asas e voos."
(Trecho de Poema en diez versos)
O quinto capítulo é Pelleas e Melisanda. Não por acaso, referência à opera de Claude Debussy. Esse capítulo põe-se como releitura da obra, um diálogo entre os personagens.
"Melisanda
Em teus braços, enredam-se as estrelas mais altas.
Tenho medo. Perdoa-me por não ter chegado antes.
Pelleas
Um sorriso teu apaga todo um passado:
guardem teus lábios doces o que já está distante.
Melisanda
Em um beijo, saberás tudo o que calei."
(Trecho de Melisanda e Pelleas)
O sexto e último capítulo é Final.
"Vieram palavras, e meu coração,
incontível como um amanhecer,
rompeu-se me palavras e se apegou ao voo,
e em suas fugas heroicas levam-no e arrastam-no,
abandonado e louco, e esquecido debaixo delas
como um pássaro morto debaixo de suas asas."
(Trecho final de Final)
VIVA NERUDA!
(todos trechos destacados foram traduzidos por Raul Albuquerque)
O terceiro é Los Crepusculos de Maruri. Segundo o próprio Neruda, os poemas desse capítulo foram escritos por ele enquanto admirava os poentes. Eles focam nos devaneios advindos dessa contemplação e são tomados pelo experimentalismo modernista.
"A tarde sobre os telhados
cai
e cai...
Quem lhe disse que viesse
asas de ave?
E este silêncio que enche
tudo,
de que país de astros
veio só?
E por que esta bruma
- pluma trêmula -
beijo de chuva
- sensitiva -
caiu em silêncio - e para sempre -
sobre minha vida?"
(Poema La tarde sobre los tejados)
"Minha alma é um carrossel vazio no crepúsculo..."
(Poema Mi alma)
"Minhas alegrias nunca saberás, maninha,
e esta é a minha dor, não as posso te dar:
vieram como pássaros a pousar em minha vida,
uma palavra dura as faria voar."
(Trecho de Hoy, que es el cumpleaños de mi hermana)
O quarto capítulo é Ventana al camino. Nele, o surrealismo ganha força total e as metáforas - quase herméticas - tomam os poemas.
"Entretanto é tão vasto céu
e roda o tempo, entretanto.
Estender-se e deixar-se levar
por este vento azul e amargo!..."
(Trecho de Playa del Sur)
"Ela - a que me amava - morreu na Primavera.
Recordo ainda seus olhos de pomba em desconsolo.
Ela - a que me amava - fechou os olhos. Tarde.
Tarde de campo, azul. Tardes de asas e voos."
(Trecho de Poema en diez versos)
O quinto capítulo é Pelleas e Melisanda. Não por acaso, referência à opera de Claude Debussy. Esse capítulo põe-se como releitura da obra, um diálogo entre os personagens.
"Melisanda
Em teus braços, enredam-se as estrelas mais altas.
Tenho medo. Perdoa-me por não ter chegado antes.
Pelleas
Um sorriso teu apaga todo um passado:
guardem teus lábios doces o que já está distante.
Melisanda
Em um beijo, saberás tudo o que calei."
(Trecho de Melisanda e Pelleas)
O sexto e último capítulo é Final.
"Vieram palavras, e meu coração,
incontível como um amanhecer,
rompeu-se me palavras e se apegou ao voo,
e em suas fugas heroicas levam-no e arrastam-no,
abandonado e louco, e esquecido debaixo delas
como um pássaro morto debaixo de suas asas."
(Trecho final de Final)
VIVA NERUDA!
(todos trechos destacados foram traduzidos por Raul Albuquerque)
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