Bem-Vindo ao Estação 018!


Seja bem-vindo ao "Estação 018"! Um blog pouco reticente, mesmo cheio destas reticências que compõem a existência. Que tenta ser poético, literário e revolucionário, mas acaba se rendendo à calmaria de alguns bons versos. Bem-vindo a uma faceta artística do caos... Embarque sem medo e com ânsia: "Estação 018, onde se fala da vida..."

terça-feira, 30 de abril de 2013

Aço



céu de aço
sol mal-humorado
nem sorriu um bom-dia
nem se insinuou na janela

céu de aço
os leões rugindo
e reverberando no aço
os círculos invisíveis

céu de aço
sítio histórico 
hoje sitiado
cercado por um tom de chumbo

céu de aço 
sou de ferro
és de carne
frágil ser que és

Raul Albuquerque
30/04/2013

domingo, 28 de abril de 2013

14%

Eu posso pedir mais mil perdões?
Roguei tanto para que estiveste feliz 
Y, por fin, supongo que estás.
Karma. Só pode ser...
Assim, permaneças feliz.

Tudo o que peço é que estejas e permaneças feliz,
Ainda que eu permaneça distante e próximo...
Yin-yang que nos persegue.
Não quero te ver triste.
Não quero não te ver.
Ainda vou me resolver - os meus problemas, eu soluciono.

Conversas nossas que não minguem, nem findem.
Algum dia, por acaso, te disse que me fazes feliz?
Volto a dizer - se já disse.
Algum dia, por acado, te disse que és 
Linda?
Caso a caso, repito: você é Linda!
Assim, posso ser feliz, "porque tu respiras".
Noutro tom,
Tudo ressoa diferente e o "amo-te" 
Indica que quero te ver feliz - e isso, por ora, basta.

Raul Albuquerque
25/03/2013

13%

Eu nada peço a ti, porque não sei o que há depois...
Rogo aos céus que algo me (pre)encha de...
Yo no sé lo que quiero. Sólo sé que te quiero.
Karma meu de ser piegas (me perdoe...)
Ah, nem sei por que estou expondo isso... só sei que estava cheio.

Todo tempo que passou falhou em 
Afastar e matar e jogar no esquecimento o que sinto.
Ya era tiempo de olvidar el amor (o la pasión), pero continua...
Não muda nada, se eu pedir desculpas pela fraqueza?
Nada? Mil perdões! Três mil perdões!
Ainda tenho medo de estar estragando tudo.

Cabe a mim - se quiseres - abdicar desse bem...
Ainda há tempo, sempre há tempo.
Vou tentar de novo. Matar esse amor de uma vez.
Acontece que te amo, só não amo esse amor
Louco que pede mais do queres dar -  mais do que mereço.
Canto, cheio de medos, o que me move.
Acho tudo tão absurdo e impossível - já disse isso, né?!
Num momento, a loucura fará sentido - ou findará.
Tanto faz o resto. Mas não falte teu sorriso.
Imploro só que não me deixes.

Raul Albuquerque
25/03/2013

12%

Eu preciso começar esse poema pedindo perdão a mim e a ti.
Ruíram as minhas lógicas e a minha resistência...
Yin-yang: era só uma desculpa para o teu Y, mas tornou-se nosso
Karma de estarmos sempre perto e longe.
Acabemos logo com isso, ou perto, ou longe (perto, por favor!).

Tentei enterrar aquilo que eu sentia...
Acontece que não se enterra o que está vivo.
Yin-yang: quando eu ia me afastando, me chamaste para perto.
Não reclamo, fazes-me bem.
Não entendo, fazes-me bem demais. Entende?
Amor? Para medi-lo pense nas galáxias sem nome.

Confesso que temo ao escrever tudo isso.
Acabo por perceber que te quero muito bem.
Voz tua que não ouço faz tempo...
Acalento-me nas lembranças...
Lembro-me dos corações antes dos sorvetes.
Confesso que tudo isso é meio ilógico,
Até digo que transbordo de não entender...
Não te peço nada, minha Linda, só te aviso:
Todo aquele enterro do meu amor era farsa.
Indo. Fui escrevendo. Findou o poema. Mas ainda há tanto para falar...

Raul Albuquerque
- sabes que a data pouco importa, mas...
25/abril/2013

sábado, 27 de abril de 2013

Para não falar do que sinto

Eu preciso desviar da pessoalidade nos meus poemas.
Isso é um fato indiscutível.
Mas,
entendam meu caso: 

é no mistério que me alimento;
é na flor suicida que penso;
é no daqui a pouco que pode vir meu presente.

Eu tento fugir do assunto,
mas sempre me flagro 
no pecado de confessar
os pecados que - ainda - não pequei.

Raul Albuquerque
27/04/2013


quinta-feira, 25 de abril de 2013

Ser outro


há refúgios
em que posso ser outro

há um pedaço
de sonho que perdura
após o abrir das portas.
nesse pedaço sou todos 
os outros que não eu.

ontem poderia ter sido
bel ami
don juan 
casa nova
- tudo de mentira.

hoje fui
bentinho
e defasado romeu
- meio de verdade.

amanhã
posso ser 
napoleão vitorioso
ou 
brás cubas em lamento
num apartamento
em paris ou veneza
a fim de um par 
para um último tango.

nomes já não são importantes
posso mudá-los numa palavra

como que 
de um lugar para o outro
passasse de viúvo a casado
de engenheiro a escritor
de budista a judeu
de mim a quem nunca fui
- nem serei.

Raul Albuquerque
25/04/2013

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Do lado de fora


Estou do lado de fora
e nada parece mais doloroso 
agora.

Estou do lado de fora
e tudo o que é meu está lá 
dentro.

Estou do lado de fora
e nunca soube como é não estar 
dentro
- experimento hoje 
a purgante sensação 
de adão e eva 
expulsos do paraíso.

Estou do lado de fora
e tenho a chave para entrar,
mas quem chegou antes
- e nasceu antes e gerou
quem me gerou -
me causa medo,
repulsa e medo, 
arrepio e medo,
choro, soluços e medo.

Estou do lado de fora
e desabrigada após briga silenciosa
com quem não posso gritar.

Estou do outro lado da rua
olhando a casa que era minha
até que o passado gritou
e eu saí.

Estou do lado de fora
e o sol castiga
- mas não mais que aquelas palavras.

Estou do lado de fora
e uso os escuros óculos
- que não obscurecem 
meu afônico desespero -
e ponho os fones de ouvido
- que não suplantam
as retumbantes vozes que 
gritam passados e inverdades -
e decido ler um livro
- mas não passo do 
primeiro capítulo,
pois o que se me passa
é o terror que vivo
(censura: 18 anos).

Estou do lado de fora
e só entro, se alguém for comigo;
e só entro, se alguém for à minha frente;
e só entro, se os céus agirem.

Se chover,
continuo do lado de fora.

Estou do lado de fora

e nada parece mais doloroso 

agora.

Raul Albuquerque
(para Thaís Gomes)
24/04/2013

terça-feira, 23 de abril de 2013

viver o filme


o rapaz ia descendo a rua
abraçando a moça
- depois de muitos desencontros -
e começou a chover

esse foi o fim do filme
que acabei de assistir

olho a janela 
e lá fora chove

mas as coincidências 
param aqui

estou deitado e doente
essa chuva que insiste em cair fina
acalma o espírito e tal...
mas só piora minha gripe

começou a trovejar,
boa noite!

Raul A.
23/04/2013

de mudança


há alguns meses,
tudo era diferente

não tudo,
mas grande parte das coisas
mudaram
- e ainda é curta a visão
que tenho daqui
para dizer se melhoraram
ou pioraram, 
só sei que mudaram.

poucas coisas 
possuem o dom
de não precisarem 
mudar -
eu não tenho esse dom:
basta olhar um texto meu
e recai sobre mim
"preciso mudar"

o óbvio é confortável,
mas não ser entendido é
apenas o começo
do caminho para 
o autoentendimento.

há um tempo,
o tempo tinha outro ritmo

tudo parecia passar
como quem passeia 
fugindo da própria vida.

hoje
não sei como o tempo
passa, mas
parece que hoje caminha
em linha reta
para um ponto focal
- ou um ponto de fuga.

(não sei bem, só sei
que anda diferente,
só sei que 
ando diferente)

parece drama,
mas
sempre me senti de mudança,
sempre arrumando a bagunça,
sempre pondo as coisas no lugar,
sempre procurando algo perdido,
sempre me ajustando,
sempre distante de algo que permaneça
sempre fazendo bem.

quando vou cansar da mudança?

quando pararei de tentar por ordem
na bendita desordem
que existe bem antes de mim?

quando hei de aceitar que
a eterna mudança
é eterna?

quando vou entender  que
o objetivo da dança das cadeiras
- que é a vida - não é a perfeição
estática e que 
só perde quem insiste 
em continuar sentado?

Aos poucos, sentimos 
que música toca
e os loucos - ah, felizes os loucos -
dançam 
e que ao fim da festa
o bom é ter histórias 
para contar.
(a bagunça que ficou? 
depois resolvemos isso!)

"mas quando vier o que é perfeito,
o que é em parte, 
será aniquilado."

Raul Albuquerque
23/04/2013

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Abreviatura


Ele aprendeu a ser prolixo
e desenhava todas as palavras que aprendia
e não as poupava de serem ditas
- ainda que inoportunamente.

De início, 
tudo novo,
escrevia os sentimentos 
por extenso
e estendia a emoção
até onde pudesse,
até onde desse para ir
- ele iria.

De início,
tudo novo,
do vinho não sobrava gota,
goela abaixo tudo iria
até o último suspiro do dia.

Nas palavras extensas,
descobriu o arrependimento
- ah, as palavras que não voltam.

De tanto arrepender-se,
aprendeu que 
obedecer é melhor que sacrificar
e poupou-se de algumas palavras
- por mais sinceras e belas que fossem.

Assim,
aos poucos, 
o menino que 
abusava das maiores e mais plurissignificativas palavras
aprendeu o valor dos silêncios comedidos.
E diante dos erros cometidos,
nenhum arrependimento
mais sonoro que o duma alma
esvaziada.

Das mais dicionárias palavras intermináveis 
às abreviações, 
às minguações das palavras,
aos silêncios.

E dos poemas enormes,
das declarações mais inflamadas,
das respostas mais longas
- que a nada respondem -,
o garoto encantado desencantou-se
e todos os seus anseios cabiam em dois versos:

"Vou-me embora pra Pasárgada,
aqui eu não sou feliz."

Raul Cézar de Albuquerque
22/04/2013

sábado, 20 de abril de 2013

A arte de resumir

(ou Como o amor está em tudo)


Nascer (do amor)
Crescer (no amor)
Aprender (o amor)
Pensar (no amor)
Vislumbrar (o amor)
Querer (amor)
Ter ou não ter (amor)
Morrer (de amor)
Ressuscitar (por amor) 
Fazer (amor)
Amar, enfim (por amor?)
Morrer (de tanto amar o amor)
Findar (o amor?)
Eternizar-se (o amor?)

se você retirar o amor, tudo continua fazendo sentido,
mas perde o encanto,
perde a graça,
entende?

Raul Albuquerque
20/04/2013

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Gravidade

segurava firme a cabeça entre as mãos
como se ela pudesse cair
depois de ver que tudo tinha caído
e só sobrara o pó do riso

Raul Albuquerque
19/04/2013

quinta-feira, 18 de abril de 2013

São João


Ultimamente
uma ideia tem me rondado.

Às vezes 
tenho vontade de guardar tudo
tudo mesmo
as coisinhas bestas que fiz,
as besteiras apaixonadas que disse,
os sorrisos sem porquê nem como que dei de graça,
os "amo-te" inconsequentes que escrevi,
as lembranças inventadas de um casamento branco
- todo branco -
enfim
as coisas que eu não queria esquecer

pegar todas elas
e guardar numa caixa preta 
opaca - para nem dar saudade do futuro 

foi, sim, legal,
mas nada que uns fins de tarde na praia não amenizem
nada que um outro encantamento não suplante
nada que não passe
afinal, tudo passa, não é?!

retomando:

pegar todas elas
e guardar numa caixa preta 
opaca - para nem dar saudade do futuro 

a ideia mais plausível até agora é a de
jogar essa caixa numa fogueira de são joão
e deixar lá queimando
indo 
sumindo

- mas o são joão está longe! ainda faltam meses!
- exatamente por isso, eu preciso de tempo 
para dar novos significados às coisas.

Raul Albuquerque
18/04/2013

terça-feira, 16 de abril de 2013

Alegorias para ela



primeira alegoria

Tempestade  
                       d e      
                                 a r  e   i    a
         sem sentido
 direção 
        ou lógica humana.

patético
pareço ter viajado                     quilômetros,
mas
para onde?
            atrás de que?
em busca de algo?
            seguindo alguém?    quem?

só      que             perdido
    sei         estou                 agora


segunda alegoria


Enquanto eu dormia,
pintaste meu quarto de tons
mais vivos e
redesenhaste a paisagem
além da janela.

Acordei e estava tudo 
diferente,
tudo novo.

Então bateu a cruel meia-noite
e foi-se o encanto,
dissolveram-se as tintas no ar
e algo parece ter destruído
tudo o mais além do meu quarto.

terceira alegoria


Tu, ó musa, foste a luz
da alva que incendeia
as árvores em pleno outono.



Tu, ó musa, foste a luz
que se espraia sobre a laguna
e dela faz espelho.


Tu, ó musa, foste a luz
que, discreta, aos poucos se revela
e torna-se meio-dia cáustico.

Tu, ó musa, foste a luz
que, sem avisar, minguou
e fez-se noite interminável.

quarta alegoria

Floresceram as campinas
antes pálidas de frio
- e eras tu o motivo.
Entretanto o inverno voltou.

quinta alegoria

tudo arrumado estava
na estante livros e fotos
na cama travesseiro e lençóis
na cadeira eu
em mim minha alma 
em minha alma o mais pacífico vácuo

terremoto
nove pontes
na escada 
riste
de plenitude

era o teu olhar
penetrando o meu


sexta alegoria

Amor à vista!
Abasteci-me e
pensei ter juntado felicidade 
para toda a vida.
Amor à vista
Direto na conta
Direto da fonte

Mas foi posto o amor em xeque
e perdeste o crédito.
Sobrou-me o débito comigo mesmo.
Tanto trabalhei e
tantos empréstimos pedi
só para repor o que levaste 
na euforia cega das madrugadas.
Se no início eu ficava vermelho
com o que falavas,
hoje ficou o saldo vermelho
e ficaram os olhos vermelhos - e
dissolveu-se lágrima a lágrima a ilusão.

Mas - que ninguém saiba - ainda fico vermelho
com tuas brincadeiras, teus elogios,
silêncios e sorrisos.

sétima alegoria

Vieste
Entraste
Ficaste
Sorriste
Encantaste
Enlouqueceste-me
Foste

ps.: e tu que eras ALEGRIA

foste afastando-te pouco a pouco
ALEG RIA
e deixaste entrar um Ó
- vocativo mudo -
ou só um O solitário
- caído de um ócio
ou de um ontem -
e hoje és 
ALEGORIA.
(abririas mão desse O
odioso e voltarias
para voltar a ser 
ALEGRIA 
ou só
alegria minha?)

Raul Cézar de Albuquerque
16/04/2013

quarta-feira, 10 de abril de 2013

(at)Raso


Chegaram atrasadas as palavras
minando lágrimas:
palavras atrasadas demais
para serem ditas
para aliviarem almas
para armarem sorrisos

Palavras atrasadas
irremediavelmente atrasadas

Chegaram atrasadas as palavras
brotando da rocha a viva água
que é sinal de morte de algo
que passou de amanhã
para ontem
sem dar o prazer de ser hoje
sem dar o prazer de ser agora
sem dar prazer


Palavras atrasadas
irremediavelmente atrasadas

Chegaram atrasadas as palavras
da boca aos olhos
de necessárias a descartáveis
palavras atrasadas
são lágrimas semeadas
em terrenos inférteis
sementes queimadas


Palavras atrasadas
irremediavelmente atrasadas

Chegaram atrasadas as palavras,
mas
de tanto chegarem atrasadas
revemos o relógio e o calendário
para ver se estavam desregulados
e concluímos:
desregulados
atrasados - ou adiantados -
gauches - esquerdos ainda que destros -
somos nós

Palavras
atrasados
sempre atrasados
irremediavelmente atrasados
lágrimas pontuais

Raul Albuquerque
10/04/2013

Fogo-fátuo


Ninguém diria
que aquela chama eterna do amor
não passava de fogo-fátuo
não passava de fogo fácil
de apagar
nem precisou chover
foi só ventar


Ninguém diria
que aquela chama eterna do amor
não passava de fogo-fátuo
não passava de fogo fácil
de apagar
nem precisou chover
nem precisou nevar
nem cair granizo no Catar
foi só ventar...

Raul Albuquerque
10/04/2013

segunda-feira, 8 de abril de 2013

imperfecto


La luna
La noche
Tus ojos

Todo tan bello,
pero siempre hay algo errado

La luna está muy lejos
La noche finda en el amanecer
Y tu ojos...
ah, tus ojos no son mios

(não, eu não estou apaixonado
acontece que gosto de escrever sobre amor
quando estou sem assunto)

Raul Albuquerque
08/04/2013

Necessário


- Eu preciso!
- Eu necessito!

Não dou ouvidos.
Crianças não sabem o que querem.
Alguns levam essa mania
mesmo depois dos dez anos de idade.

Necessidades 
- todas inventadas.
Necessidades
- tão desnecessárias.

- Eu preciso!
- Eu necessito!

Eu rio da sua
fútil
necessidade
inútil

irrisória
necessidade
simplória

Suas tão urgentes
tão inconstantes
tão vitais
necessidades
tão desnecessárias.

Raul Albuquerque
08/04/2013

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Vapor


Saí de casa
correndo 
a todo vapor 
- não só para ver-te,
mas para ter-te,
para ser teu carrasco
carcereiro
escravo
concubino
brinquedo de ninar.

Subi as escadas
a todo vapor.

Toquei a campainha
e em mim 
já apitavam chaminés
e trabalham máquinas.

Quando abriste a porta,
o calor do sétimo círculo do inferno de Dante
me tomou
e começou a me consumir.

Entramos
e já nos unimos:
tua coxa direita em uma de minhas mãos
teu pescoço na outra mão
tua boca na minha - e esqueço o mundo.
(sem tempo para um inútil boa-tarde,
nós fizemos a tarde ser ótima).

Rápidos pensamentos:
se sobre a mesa,
será que ela aguenta?
se no tapete da sala,
e se chegar alguém?
se contra a parede,
será desconfortável?

E me surpreendes
ao me levar suspiro a suspiro
até teu quarto
- e pediste silêncio,
teu irmão mais novo dormia no quarto ao lado.

Era teu quarto
nossa casa de máquinas
era hora de confeccionar amor
a todo vapor

confeccionar amor
em escala industrial
confeccionar amor
a quatros mãos
confeccionar amor
a peitos cheios
confeccionar amor
a ferro e fogo
confeccionar amor
para o ano todo
confeccionar amor
de modo artesanal
confeccionar amor
a todo vapor

o meu vapor 
que se funde
- e se confunde -
com o teu vapor.

e em tanto vapor
e em tanto amor
nenhum pudor
inflamados vocativos
              provocativos
e em tanto ôr
e em tanto ôr
e em tanto oh
e em tanto oh

apitam todas as chaminés
fumaça brança
habemus amore 
fumaça branca
apitam todas as chaminés

e somos, pois, silêncio
férias coletivas
jantar em família
como se amor ainda não houvesse.

Raul Cézar de Albuquerque
03/04/2013

terça-feira, 2 de abril de 2013

Tempo Agora


Tempo 
passa por mim em profundo silêncio
e com a leveza 
que os lírios só emprestam
às serpentes que preparam o bote.

Atacado
- e recuperado do ataque -
vejo que está tudo perdido
e quebrado 
abandonado num ponto 
irrelevante do caminho.

Lamentar
já não vale a pena
já não vale o lamento
já não vale a possível lágrima.

Agora
é juntar o que sobrou 
e tentar construir algo com aquilo
ou só tentar sobreviver mesmo.

Tempo
passou por mim em profundo silêncio
e trouxe consigo
tempestade de areia que enevoa os ares
por minutos-séculos de vida
- e quando a poeira baixa
calculamos as baixas e as ruínas.

Tempo
passeou comigo por corredores
e por cômodos
deixando cheiros característicos 
e incômodos.

Agora
não há como estar em casa
e não sentir os cheiros do passado:
o cheiro distante da inocência
o cheiro recente da decepção
o cheiro ansioso do amor vindouro
o cheiro forte das mágoas
o cheiro leve das felicidades anônimas
o cheiro bom 
- ainda que putrefacto e violento -
do possível belo amor que não deu certo.

Tempo
Agora

Agora
é necessário extinguir
todos esses cheiros
que se impregnaram nas roupas
nos móveis
e nos imóveis
- deixá-los prontos para
novas marcas
novos arranhões
novos pés quebrados
novos riscos na parede
novas lembranças
que passam como um filme
- ou como um conto russo
ou como uma tragédia shakespeareana
ou como um diário adolescente
ou como uma história esquecida.

Raul Cézar de Albuquerque
02/04/2013

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Ode à Verdade


eu quero a verdade
não a verdade vendida
mas a verdade vedada

há quem sofra até hoje 
por ter crido numa mentira
desejada

mas faz parte do sono da existência
sonhar que de limoeiros
brotarão maçãs...

mas só faz parte do sono
quando acordar - e sempre acordamos -
só brotarão limões.

verdade seja dita:
a verdade não está desaparecida
nem desfalecida numa ruela

a verdade está escondida
de quem ama uma mentira bonita
de vez em quando.

Raul Albuquerque
01/04/2013