Onde estará Guilhermina?
Quando minha irmã a convidou
e eu saí para abrir-lhe a porta,
entrou o sol, entraram as estrelas,
entraram duas tranças de trigo
e dois olhos intermináveis.
Eu tinha quatorze anos
e era orgulhosamente escuro,
magro, firme e franzino,
funeral e cerimonioso:
eu vivia com as aranhas,
umedecido pelo bosque,
conheciam-me os besouros
e as abelhas tricolores,
eu dormia com as perdizes
submergido na hortelã.
Então entrou Guilhermina
com dois relâmpagos azuis
que me atravessaram o cabelo
e me cravaram como espadas
contra os muros do inverno.
Isto aconteceu em Temuco.
Lá, ao Sul, na fronteira.
Passaram lentos os anos
pisando como elefantes,
latindo como raposas loucas,
passaram impuros os anos
crescentes, desgastados, mortos,
e eu andei de nuvem em nuvem,
de terra em terra, de olho em olho,
enquanto a chuva na fronteira
caía, com a mesma roupa.
Meu coração caminhou
com intransferíveis sapatos,
e digeriu espinhas:
não teve trégua onde esteve:
onde eu peguei me pegaram,
onde me mataram caí
e ressuscitei com leveza,
e logo e logo e logo e logo,
é tão longo contar as coisas.
Não tenho nada a acrescentar.
Vim para viver neste mundo.
Onde estará Guilhermina?
Poema "Dónde estará la Guillermina?" de Pablo Neruda.
Escrito e Publicado em 1958, no livro "Estravagario".
Fielmente traduzido por Raul Cézar de Albuquerque.
Belíssimo poema, com palavras humildes, não acrobáticas mas eficientes! Emocionante!
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