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terça-feira, 20 de novembro de 2012

Os outros nomes de Fernando Pessoa


Fernando Pessoa é - nunca é demais relembrar - o maior nome do poesia modernista portuguesa. Destaca-se não só pelo seu lirismo absurdo e pelo jogo literário que construiu, mas por que ninguém absorveu como ele o espírito modernista: O que não tem caráter, mas que precisa ser caracterizado.
Pessoa incorporou a dúvida do início do século: "O academicismo morreu, mas... e agora?" e decidiu reunir em si próprio tudo do passado que poderia levar ao futuro da poesia. Para isso, deixou sua personalidade de lado e deu lugar a personagens - ou personas como fez a ironia da História ao colocar como sobrenome do poeta - "Pessoa" - o nome dado às máscaras do teatro grego.

O poeta tinha uma relação muito mística com a palavra - assim como os grandes Guimarães Rosa e Clarice Lispector. Isso, juntamente com toda a sua genialidade, resultou na construção de mais 70 identidades falsas entre heterônimos, semi-heterônimos e esboços de heterônimos. Tornou-se um criador de escritores.
Seu processo de construção de poetas, porém, destaca-se pelo refinamento, pois cada heterônimo possuía nome, biografia, profissão, ideologia, estilo próprio, "escola" literária marcante e mapa astral específicos.

Nesse infinidade de escritores criados pelo próprio Pessoa, destacam-se três heterônimos pela complexidade e pela perfeição da construção identitária, são eles:

Alberto, Ricardo e Álvaro imaginados pelo pintor Almada Negreiros

1. Alberto Caeiro:
Segundo Pessoa, o mestre de todos os outros heterônimos. Caracteriza-se como um poeta árcade que fugiu para o campo. Ele prega a simplicidade das coisas, despreza as "questões universais" e pouco se dedica à filosofia e à metafísica. Sua principal obra é "O Guardador de Rebanhos".

Sou um guardador de rebanhos.

O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.

(poema IX em "O Guardador de Rebanhos")


2 . Ricardo Reis:
Como Caeiro, ama o campo e a vida bucólica, mas tem o pessimismo causado pela inevitabilidade da morte e pela passagem cruel do tempo. Poeta neoclássico, busca no epicurismo a raiz da felicidade, ele desconfia da felicidade plena e controla tudo com a razão. Escritor de suas "Odes".

Só esta liberdade nos concedem
Os deuses: submetermo-nos
Ao seu domínio por vontade nossa.
Mais vale assim fazermos
Porque só na ilusão da liberdade
A liberdade existe.
(ode de Ricardo Reis)



3 . Álvaro de Campos:
É o mais ligado ao movimento modernista, com forte tendência ao futurismo. Abusa do verso livre (ainda metrifique e rime às vezes), das pontuações exclamativas e das onomatopeias. Engenheiro naval, apresenta uma poesia por vezes desleixada ou rápida demais - característica futurista - e, outras vezes, uma poesia reflexiva.

Temos todos duas vidas:

A verdadeira, que é a que sonhamos na infância,
E que continuamos sonhando, adultos, num substrato de névoa;
A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros,
Que é a prática, a útil,
Aquela em que acabam por nos meter num caixão.
("Datilografia" de Álvaro de Campos)

Há ainda o ortônimo Fernando Pessoa (ele mesmo) que escreve "Mensagem", poesia carregada de nacionalismo e saudosismo. Na obra, ele acaba por misturar o épico e o lírico ao (re)contar as histórias de Portugal. Ainda na sua obra lírica, destaca-se "Cancioneiro" onde o poeta explora temas existenciais como amor, solidão, futuro e infância.

Ó mar salgado, quanto do teu sal

São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
("Mar Português" (do livro "Mensagem") de Fernando Pessoa)

Na prosa, há o semi-heterônimo Bernardo Soares (que em muito se assemelha ao próprio Pessoa) que escreveu "Livro do Desassossego", livro com forte carga emocional e cheio de um pessimismo encravado pela modernidade no homem comum. O livro destaca-se pelos aforismos e pela profundidade reflexiva.
"Amar é cansar-se de estar só: é uma covardia portanto, e uma traição a nós próprios. (Importa soberanamente que não amemos)" - Bernardo Soares em "Livro do Desassossego"

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