Bem-Vindo ao Estação 018!


Seja bem-vindo ao "Estação 018"! Um blog pouco reticente, mesmo cheio destas reticências que compõem a existência. Que tenta ser poético, literário e revolucionário, mas acaba se rendendo à calmaria de alguns bons versos. Bem-vindo a uma faceta artística do caos... Embarque sem medo e com ânsia: "Estação 018, onde se fala da vida..."

quarta-feira, 31 de julho de 2013

complicado


essa história recente
de acordar cedo
me fez ver que o sol
guarda o melhor de si
pros momentos mais escusos
do dia

essa questão de querer
não querer algo que já se quer
há mais de dez meses
tem me feito ver que
nunca somos homogêneos
nunca mesmo

essas dores sem motivo
que acontecem às vezes
na caixa torácica 
me fizeram crer
que tudo que acontece cá dentro
foge um pouco do nosso controle
um pouco
um muito
um tudo meu dela

é
tem sido complicado 
falar sobre amor

Raul Albuquerque
31/07/2013

terça-feira, 30 de julho de 2013

por alguns minutos

por alguns minutos 
qualquer que batesse à porta
seria calorosamente recebido

nenhuma emoção seria rechaçada
nenhuma visita seria expulsa

o sol poderia entrar pelas janelas
sem medo
elas permaneceria abertas
enquanto durasse aquele êxtase

eu deixaria a porta aberta
e a sala arrumada
- café, chá e água na mesa de centro -

certos móveis velhos
seriam jogados pela janela
e se encantariam no chão

mas ela disse aquilo
e as velharias tomaram conta do espaço
e as portas e janelas fecharam-se
e eu fechei os braços
como se me doessem os órgãos.

Raul Albuquerque
30/07/2013




o estar

o estar só
é uma ilusão que
- se bem alimentada -
nos deixa de estômago vazio.

o estar só
é uma ilusão que
- se definitiva -
nos mata a contagotas.

o estar só

o estar com 
é uma ilusão que 
- se bem provada -
alimenta por séculos

o estar com 
é uma ilusão

(mas, quem atenta?
a vida não passa de ilusionismo)

Raul Albuquerque
30/07/2013

terça-feira, 23 de julho de 2013

Ao amigo

O poema perfeito, meu caro,
nem cabe nas palavras.

Talvez num papel todo letrado
e encharcado de lembranças nulas
esteja um poema bom.

Talvez num momento de inspiração
teçam-se frases bonitas e 
imagens irrepetíveis.

Talvez o mais belo poema composto
seja escrito em céus de fim da tarde
e as melhores figuras não sejam de linguagem
mas aquelas fotos que tiraste dos olhos
perdidos dela que achaste tão lindos.

Raul Albuquerque
23/07/2013

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Dissonante

no jardim
as flores aparecem lentas

no céu
as nuvens silenciosas

na rua
as pessoas andam sem pressa

aqui dentro
o coração pulsa rápido
fazendo tanto barulho
querendo que tudo chegue agora

R. A.
22/07/2013

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Menina da Lua


a Priscila Ribeiro

Desde tempos imemoriais,
contam-se histórias sobre princesas
que eram trancadas em torres
a esperar seus respectivos príncipes
- todos encantados.

Mas pouco fala-se de
uma menina que em noites cheias
subia as escadas da torre
e corria à sacada só para ver a lua.

Quase ninguém entendia,
mas toda noite ela subia.

Não esta esfera rochosa esburacada
que desfila silente em noites mornas
sobre algumas janelas fechadas,
mas o prato de prata
em que ela se via e
em torno do qual as galáxias
giravam sem parar.

Quase ninguém entendia,
mas toda noite ela subia.

Para ela, subir aquela escada

era como descer a um lago
e vislumbrar o céu da sacada
era ver todas as constelações
na água e
ao mínimo sinal do vento
as águas balançavam
fazendo dançar as estrelas.

Quase ninguém entendia,
mas toda noite ela subia.

Ver a lua era ouvir os ecos
que haviam se perdido
nos contratempos e nos atrasos
do dia. Ver a lua era sentir
os toques que passaram 
de raspão na estação central.
Ver a lua era fazer voltar
o cheiro de essências
deixadas no caminho. Ver
a lua era sentir o gosto
do prato não preparado
e da emoção ensaiada.

Ver a lua é ver-se.
Quase ninguém entende,
mas toda noite ela sobe.

Raul Albuquerque
19/07/2013

terça-feira, 16 de julho de 2013

Forma

Zygmunt Bauman

como dar forma
a desejos voláteis,
quando já não há
fôrmas confiáveis?

o que fazer para 
dar à vida
um certo sentido,
quando todo
caminho parece perdido?

como curar 
as dores
que destilam mel,
se lambuzar-se
é permitido
a quem vive sob o céu?

por que se firmar,
se a terra gira?
por que se cobrir,
se a chuva cai?
por que se encher
de tanta ira,
se com o tempo
ela se esvai?

e segue como um rio
que em suas voltas
volta
que em seus meandros
me percorre
inteiro em som
e medo de ser
o que hei de ser
quando desistir
de mim.

Raul Albuquerque
16/07/2013
Dedicado a Priscila Ribeiro

sábado, 6 de julho de 2013

sem título

este poema não tem título
não tem tema não tem
rima não tem nem 
esperança de ser 
famoso ou relido
por alguém

este poema é meu
e como eu não
tenho nada
nada pude dar-lhe
mas queria escrevê-lo
e enchi-o do meu vazio

Segundo Congresso Internacional do Medo


Permanentemente não cantaremos o amor,
que se tornou cegueira alucinógena.
Cantaremos o medo, mas não apenas o medo,
pois cantar só o medo é medo de cantar
a vida - que vai além do amor e do medo.
Cantaremos o choro e o sorriso
com o mesmo ímpeto poético
quando ambos valerem a pena.
Cantaremos as manhãs de dias úteis
e também de sábados, domingos e feriados
sem nenhum profissionalismo.
Cantaremos as cerejeiras em flor
e os cactos e os descampados
com o mesmo olhar primaveril.
Cantaremos as tardes de chuva
e os protestos inflamados com
o mesmo calor na alma.
Cantaremos até o que não há,
o que no ar se perde, o que não
acontece, o que nos irrita.
Permanentemente não cantaremos o amor
e talvez assim ele não volte nunca mais
às arrasadas terras que nós
sempre falhamos em proteger
e então nasçam flores vermelhas e impolutas.

Raul Albuquerque
06/07/2013

terça-feira, 2 de julho de 2013

serenata


E eu, que nunca
vi sentido ou beleza suficiente
em declarações públicas de amor,
fincaria as pernas bambas
bem em frente à tua janela 
trêmulo
erraria alguns acordes
até conseguir tocar tua música predileta
e ir desafinando
pela letra que te descreve e
como os olhos fechados
imaginaria-te abrindo a janela encantada
e a minha garganta rouca,
os meus dedos feridos de tanto ensaiar
e minhas pernas fracas
te prestariam uma homenagem
tentando trazer a uma noite tua
a plenitude que teu existir
me traz todas as manhãs.

Raul Albuquerque
02/07/2013