tempo velho
sei que não voltarás
mas não quero dormir
sem antes dizer que
foste bom
não sei o quanto velho és
mas sei que foste presente
e passaste
foste presente e passaste
como tantos quadros
de minha galeria:
frases que já foram verdades
mentiras nas quais achei sentido
silêncios nos quais li discursos
sonos cheios de vontades
reprovações cheias dum amor raro
tempo velho
foste bom
mas já estás velho
tempo velho
não volte
nem se eu pedir
tempo velho
- quanta besteira digo -
não podes voltar
nunca voltarás
tempos
não são bons filhos
ainda que bem tratados
para casa nunca retornam
Raul Albuquerque
30-31/08/2013
Bem-Vindo ao Estação 018!
sábado, 31 de agosto de 2013
segunda-feira, 26 de agosto de 2013
satyagraha

justiça
é um menino órfão
e travesso
que por vezes foge
de onde deveria estar
justiça
tem dificuldades
em ser adotado
um eterno adolescente
que pelos milênios passa
sem ter nunca achado casa
nem código que o alimente
justiça
vive na rua
nunca constituiu lar
mas sempre lhe mandam ficar
num quarto de quartel
com teto baixo
sem chance de ver o céu
nem uma estrela cadente
nem uma lua dormente
obrigam-lhe a estar num papel
mas
justiça
é um menino órfão
e travesso
que por vezes foge
de onde deveria estar
Raul Albuquerque
26/08/2013
sábado, 24 de agosto de 2013
tributos
nossos corpos
sempre vizinhos
não se conheciam
mas veio o tempo
e nos deixou
extasiados numa tarde
sim
extasiados
os teus lábios
me roubaram o ar
a compostura
a timidez
e me roubou de mim
os teus braços
mais que abraçaram
tentaram unir nossos corpos
as tuas mãos
abriram minha camisa
e tentaram nos fazer
uma só carne
a tua língua
as tuas pernas
colaram-se as minhas pernas
se eu precisava de ar
eu precisava mais de ti
da tua mão tentando rasgar minha pele
sob a regata branca
vi da terra dura dos teus seios
brotarem as sementes
antes dormentes
sob o jeans
eu te erigi um monumento
a tua voz me fez erguê-lo
o fiz para que o vejas
para que o beijes
para que o guardes com teu corpo
ah
das terras que manam leite
eu beberei
até que nada mais haja
ah
nos jardins
dos quais corre mel
eu entrarei
e dançarei
por noites e tardes
eternas
eu entrarei
e dançaremos
Raul Albuquerque
24/08/2013
sempre vizinhos
não se conheciam
mas veio o tempo
e nos deixou
extasiados numa tarde
sim
extasiados
os teus lábios
me roubaram o ar
a compostura
a timidez
e me roubou de mim
os teus braços
mais que abraçaram
tentaram unir nossos corpos
as tuas mãos
abriram minha camisa
e tentaram nos fazer
uma só carne
a tua língua
as tuas pernas
colaram-se as minhas pernas
se eu precisava de ar
eu precisava mais de ti
da tua mão tentando rasgar minha pele
sob a regata branca
vi da terra dura dos teus seios
brotarem as sementes
antes dormentes
sob o jeans
eu te erigi um monumento
a tua voz me fez erguê-lo
o fiz para que o vejas
para que o beijes
para que o guardes com teu corpo
ah
das terras que manam leite
eu beberei
até que nada mais haja
ah
nos jardins
dos quais corre mel
eu entrarei
e dançarei
por noites e tardes
eternas
eu entrarei
e dançaremos
Raul Albuquerque
24/08/2013
quarta-feira, 21 de agosto de 2013
sobre semear
agora restou-me o esperar
e espero no terraço
sentado na cadeira que balança
vendo sol e lua fazerem sua dança
girarem em sua valsa
ignorando minha pressa
e desço ao campo
retirando os sapatos
e folgo o nó da gravata
a terra parece nula
mas já possui
todas as minhas sementes
todas
joguei todas
talvez eu tenha confiado demais
nessa terra potencialmente infértil
já não importa
lancei todas
nenhuma na mão restou
não me cabe pedir de volta
as sementes que
tão devotamente
lancei
é tarde
não deve passar das duas
mas as nuvens
- tão pequenas -
começam a cobrir o sol
- tão longe -
e fazem tudo parecer noite
por meia hora
caminho
com medo de pisar em sementes
caminho
por onde passo
e recolho um maço
de entrementes enraizados
a terra engoliu minhas
sementes
dei todas
não me cabe pedir
voltar atrás é para os grandes
e minha pequenez é constrangedora
vontade de correr
para dentro da casa grande
e gritar às paredes machadas
de café mofo e tempo
"deem um sumiço em mim"
"salvem-me de mim"
quando de vento se semeia
para se colher um furacão?
quando de vento se semeia
para se colher uma ventania?
quando de vento e tempo e dor
se semeia
para se ouvir a voz dela
numa brisa peregrina?
Raul Albuquerque
21/08/2013
sexta-feira, 9 de agosto de 2013
repertório
a pedido de Rebeca Santana
sou motivo de zombaria no Olimpo
atuo em tragicomédias no meio da praça
já fui ferido por todas as flechas da aljava de eros
e já bebi de todas as safras de vinhos de afrodite
sou motivo de riso dos deuses
estranhos amores me tomam
e eu já não sou meu
sou motivo de pena nas tavernas e nas fofocas
essa minha entrega que me recorta
e me distribui como panfletos na rua dos sonhos
sou motivo de vergonha a mim
eu que tentei me segurar
prender os poemas no baú
guardar as declarações no pulmão
mas falhei em tudo
e falei em amor
quando era necessário calar
Raul Albuquerque
09/08/2013
quarta-feira, 7 de agosto de 2013
Cerrados

E agora
eu me sinto
como o aluno
que fecha os olhos
durante a chamada
e ouve o nome de todos os colegas
serem chamados pela voz da professora
menos o seu
e permanece com os olhos fechados
esperando seu nome ser chamado
ou seu ombro ser tocado por alguém
que diga que ele já pode ir para casa.
Raul Albuquerque.
07/08/2013
terça-feira, 6 de agosto de 2013
Ação de divórcio

Ao excelentíssimo Juiz de todas as varas,
Ele, brasileiro, (até hoje) casado, arquiteto (de ilusões), residente e domiciliado na Alameda Dela, nº 1, nesta cidade (iluminada e aberta), por seu advogado (e amigo das sextas à noite), com fundamento na vita brevis, vem propor a presente ação de divórcio contra Ela, brasileira, (até hoje) casada, do lar (das ilusões solúveis), residente e domiciliada na Rua Dele, nº 343, nesta cidade (triste e maledicente), em função do que se segue.
1. Requerente e requerida casaram-se numa noite chuvosa de março, talvez mal presságio, vigorando quantos aos bens regime de comunhão universal, quantos aos corpos regime de comunhão parcial, quanto aos sentimentos regime de separação total, sendo consequentes dessa união uma depressão nascida em data não anotada e uma solidão despertada em data não sabida.
2. O casal encontra-se separado de fato desde que o choro dela, decorrente dos desaparecimentos dele, começou a incomodá-lo, sendo improvável qualquer reconciliação, ainda que possível.
3. Os frutos do relacionamento encontram-se atualmente sobre a vida da mulher. O requerente pretende que assim permaneça o caso.
4. A requerida exerce atividade lucrativa, não necessitando, pois, de alimentos.
5. Em relação aos frutos do relacionamento sobre a vida da mulher, convém que uma espécie de arrependimento e/ou pesar visite o requerente quinzenalmente permanecendo com ele das 7:00 hs às 22hs da segunda-feira, no aniversário do autor e no dia dos pais, além de festas de fim de ano.
6. O casal não possui bens a partilhar. Sobraram-lhes miudezas: a ele a alegria e a ela a dor de não terem concebido filhos; algumas lembranças doces e outras amargas ficaram com ela; quanto ao prazer advindo dos beijos, abraços e demais contatos mútuos, não se vê solução plausível para a partilha, sendo assim sugerido o descarte dele.
7. Portanto, reduziram o amor eterno a uma tragédia de 4 anos, estando o casal separado há 2 anos (o que compreende 3 relacionamentos amorosos dele e 5 internações dela), sendo quase nula a possibilidade de reatamento (sendo tudo possível sob o sol).
8. O autor requer a V. Exa. que seja determinada a citação da requerida para que, no prazo legal, traga a defesa e as provas que tiver, - avisando desde já que a requerida pode chorar durante a intimação, não tanto pela situação, mas pelo que poderiam ter sido os dois, pelos filhos não tidos, pelo amor investido que agora rui, pelas ideias tão concretas que hoje são pó, pelas promessas que nem no papel ficaram, pelas juras feitas e negligenciadas, por eventuais descasos e esquecimentos, pelo sentimento de tempo perdido - sendo afinal julgado procedente o pedido para o fim de ser decretado o divórcio ao ora requerente e expedida a carta de sentença que permitirá a averbação junto ao Cartório do Registro Civil de Pessoas Naturais.
Raul Albuquerque
05-06/08/2013
5. Em relação aos frutos do relacionamento sobre a vida da mulher, convém que uma espécie de arrependimento e/ou pesar visite o requerente quinzenalmente permanecendo com ele das 7:00 hs às 22hs da segunda-feira, no aniversário do autor e no dia dos pais, além de festas de fim de ano.
6. O casal não possui bens a partilhar. Sobraram-lhes miudezas: a ele a alegria e a ela a dor de não terem concebido filhos; algumas lembranças doces e outras amargas ficaram com ela; quanto ao prazer advindo dos beijos, abraços e demais contatos mútuos, não se vê solução plausível para a partilha, sendo assim sugerido o descarte dele.
7. Portanto, reduziram o amor eterno a uma tragédia de 4 anos, estando o casal separado há 2 anos (o que compreende 3 relacionamentos amorosos dele e 5 internações dela), sendo quase nula a possibilidade de reatamento (sendo tudo possível sob o sol).
8. O autor requer a V. Exa. que seja determinada a citação da requerida para que, no prazo legal, traga a defesa e as provas que tiver, - avisando desde já que a requerida pode chorar durante a intimação, não tanto pela situação, mas pelo que poderiam ter sido os dois, pelos filhos não tidos, pelo amor investido que agora rui, pelas ideias tão concretas que hoje são pó, pelas promessas que nem no papel ficaram, pelas juras feitas e negligenciadas, por eventuais descasos e esquecimentos, pelo sentimento de tempo perdido - sendo afinal julgado procedente o pedido para o fim de ser decretado o divórcio ao ora requerente e expedida a carta de sentença que permitirá a averbação junto ao Cartório do Registro Civil de Pessoas Naturais.
Raul Albuquerque
05-06/08/2013
sábado, 3 de agosto de 2013
amores vários
quantos amores vários
se podem sentir num só coração?
são imagens projetadas na parede
retratos renascentistas
imagens surreais
- pois tais perfeições não cabem
aos mortais -
dentre tantas luzes
tantas ilusões projetadas
que verdades embutidas?
que mentiras veladas?
quantas tardes despidas
por quatro olhos enfileirados?
sobre a grama que não há
olhando o céu em que não chove
um sol que é só luz
uma parede azul
um vento que não me move
são fotos de alguém
ou de um ninguém
que existe e insiste
em soltar frases encantadas
ou encantadoras
que nos fazem soltar declarações
impensadas
e comprometedoras
amantes
o amor toma-nos a boca
e usa-a como bem quer
soltando fofos absurdos
e mentiras
- que devem ser perdoadas
porque estamos alucinados
sem culpa nem porquê -
declarações de amor
são -sem exceção - frutos
de uma espécie de torpor
embriagamento
em que a alma cai
e não sabe levantar
quantos amores vários
se podem sentir num só coração?
quantas imagens forem assim
possíveis...
quantas paredes houver
para serem pintadas...
quanto vinho ainda houver
para ser bebido...
quantas vidas há para viver?
Raul A.
03/08/2013
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